
Às vezes sentado na sala escura me pego a pensar na estrada.
De como é bonito ver o sol colorir as nuvens e como é bom se deixar levar pelas
curvas sinuosas do asfalto. O verde que corre de costas pelo vidro do carro, a
mão que brinca de peixe no vento, a cabeça que vai e volta em inúmeros
pensamentos e aquele sono gostoso que pesa os olhos e alivia os ombros.
Anseio pela viagem e pelo desconhecido. Acho incrível a
capacidade de algumas pessoas de saírem de suas casas com uma mochila, um bom
sapato e muita coragem. Não vejo esse tipo de viajante em mim. Nunca foi de
acampar ou de pegar caronas na estrada, mas isso não diminui o valor do
caminho.
Muitos falam que a estrada é solitária, li isso em muitos
livros também, mas a verdade é que a estrada recebe a todos que nela pisam.
Claro que receber não é zelar, a estrada não pode se preocupar com o suor da
sua testa ou o calo do seu pé. Nela você aprende mais sobre você, não só
limites, mas também sentimentos e dor.
Nós passamos muito tempo fugindo da dor, nos dopamos na
esperança que ela desapareça, mas no fim das contas, ela continua lá, a gente
que vai aprendendo a ignorar. Dizem que isso faz de você alguém mais forte. Eu
ainda acho que forte é quem encara a dor nos olhos, resolve as coisas e sai
andando. Sei que isso pode ser mal interpretado e encarado como falta de
educação, mas pense bem, educação de quem? Quem te ensinou a ignorar a dor?
A estrada não é feita de caminhos fáceis, talvez por isso
ela me fascina tanto. Afinal nunca fui normal e sinceramente, nesse meu quarto
de século, considero isso um elogio.
Qual o propósito da estrada? Ela é uma imagem densa, sem
dúvida, um signo forte de liberdade, força e rompimento. É como a esfinge de Tebas, é necessário
decifrar ou se deixar devorar.
A estrada não se trata de uma fuga, se trata de um adeus.
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